Despreparo de empresas pode atrasar conclusão de negócios
Passivos tributários e trabalhistas, questões legais, éticas e concorrenciais, e até divergências de valores entre sócios influenciam na avaliação de venda das companhias
O despreparo de empresas em apresentar todas as informações exigidas por investidores pode atrapalhar a conclusão de negócios num cenário econômico de 2018 considerado favorável para fusões e aquisições ou para a venda de participações societárias.
Segundo um levantamento realizado pela Okto Finance com mais 150 investidores, a falta de controles da contabilidade, problemas de registros de contratos, questões fiscais e trabalhistas, cálculo do lucro antes de impostos, taxas, amortizações e depreciações (Ebitda) , dentre outros, respondem por cerca de 55% da não conclusão dos negócios na fase de due diligence (diligência) ou na próxima etapa, quando já se passaram meses ou até anos de negociação.
“Muitas vezes, o dono do negócio é surpreendido com um lançamento errado do contador, e o investidor estrangeiro já cria uma dúvida sobre a toda a contabilidade e a transparência no negócio”, conta o especialista em M&A e diretor da Okto Finance, David Denton.
Ao mesmo tempo, o cenário econômico é considerado como promissor para a realização de negócios em 2018. “É um casamento entre o comprador e o vendedor, deve-se ter transparência, honestidade e confiança”, afirma o conselheiro da Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital (Abvcap), Clóvis Meurer.
Na expectativa dele, o mercado de private equity e venture capital – que adquire participações em empresas e projetos – poderá crescer entre 25% a 30% neste ano. “A economia está pujante”, diz Meurer. Ele pondera que o processo de compra de uma empresa pode demorar de seis meses a um ano. “É o namoro antes do casamento.”
Segundo a CEO da AGR Consultores, Ana Paula Tozzi, para que essa união entre parceiros, ou entre compradores e vendedores seja possível, antes da decisão de venda de uma empresa ou de parta da empresa deverá haver consenso entre os sócios. “Cada acionista deve fazer uma reflexão sobre o que planeja para sua vida pessoal. Se ele pretende continuar no negócio ou sair. Se abrirá mão do controle ou não. Se venderá para um investidor estratégico ou para um fundo. Muitas vezes, o negócio não anda por desencontro entre sócios. É preciso um alinhamento entre as partes interessadas”, afirma a executiva.
O sócio da Iwer Capital, Artur Lopes, completa que os empresários devem passar as informações sobre o negócio – passivos fiscais e trabalhistas – com a maior clareza. “É desejável fazer uma reestruturação antes, a lição de casa, para comprovar números melhores”, sugere. Lopes acredita que neste ano virá muito capital de fora para o Brasil. “Os ativos estão muito baratos [em dólar]”, observou o especialista.
Para a CEO e fundadora da Sparks Capital, Ana Elisa Bacha Lamounier, a maior parte das transações não são concluídas devido à divergência de valores e divergências entre os sócios. “É sempre uma briga”, confirma.
Por outro ângulo, Ana Elisa aponta que o crescimento da economia deverá incentivar a conclusão de centenas de transações. “O juro mais baixo vai reduzir o custo de capital para investimentos. Esse cenário mais estável melhora o índice de perpetuidade das empresas e torna o valuation [avaliação] mais técnico”, diz a CEO da Sparks.
Na opinião do professor da Trevisan Escola de Negócios, Walter Franco Lopes da Silva, o ambiente para operações de compras de empresas e participações é promissor. “A dificuldade está na mensuração dos riscos”, disse.
O professor recomenda que os vendedores entreguem os números “impecavelmente” apurados aos potenciais interessados. “Isso evita perdas, multas contratuais, obrigações ou revisões no futuro”, aconselha Silva sobre a verificação de pendências tributárias, trabalhistas, questões societárias, legais e concorrenciais”, diz.
Já o sócio do escritório Miguel Neto Advogados, Bruno Guarnieri, sugere que os empresários realizem a “vendor-diligence” para apurar contigências e ajustar preços antes se lançar ao mercado. “Até por falta de uma gestão mais profissional, o empresário acaba descobrindo surpresas negativas na diligência. É mais recomendado fazer esse processo com mais calma e não ceder a ansiedade do momento”, avisa.
Quanto aos demais riscos, na semana passada, mais uma agência de classificação de risco – a Fitch Ratings – rebaixou a nota do Brasil, fator que pode afetar a intenção de fundos internacionais em aportar recursos no País.
“Desde 2015, não temos mais a nota de bom pagador. Para o estrangeiro fica a percepção de que o Brasil não vai ter condições de honrar seus compromissos. Isso compromete a nota de empresas como a Petrobras”, alerta o diretor comercial nacional do Grupo Brugnara, Luiz Souza, sobre um eventual aumento dos tributos sobre as empresas para equacionar as contas públicas no País.
Souza lembrou que no ano passado, o mercado de fusões e aquisições movimentou US$ 48 bilhões em transações no Brasil. “Ainda não sabemos as consequências desse novo rebaixamento”, ponderou o diretor.